1 – Introdução à situação-problema

Não é de hoje a discussão, acalorada, diga-se, sobre como os órgãos e entidades da Administração Pública devem proceder para contratar para os servidores de seu quadro de pessoal, cursos de graduação, de pós-graduação, palestras, treinamentos específicos, conferencistas e instrutores, conciliando as normas legais para contratação de serviços (CF, art. 37, XXI e Lei 8.666/93) e as peculiaridades inerentes a essa espécie de prestação de serviço. As dificuldades são inúmeras, e diversos são os fatores que contribuem para aumentar a insegurança no momento de celebrar tais contratos.

O primeiro ponto diz respeito à obrigação de realizar licitação. Como o dever de licitar é imperativo e fazê-lo pelo critério de menor preço é regra geral, o problema advém da imensa dificuldade (adiante veremos que na maioria dos casos haverá impossibilidade) de se estabelecer critérios de aferição idôneos que apontem com segurança a proposta efetivamente mais vantajosa, o que eleva sobremaneira o risco de insucesso na contratação. A experiência tem demonstrado que contratos dessa natureza, quando licitados, não raro, anotam má prestação de serviço e não atendimento aos objetivos traçados.

Por lado outro, os contratos celebrados com fundamento nas exceções ao dever de licitar (dispensa e inexigibilidade de licitação) geram enorme desconfiança quando submetidos ao controle de legalidade. É que os procedimentos de contratação sem licitação costumam fornecer aos órgãos de controle rica fonte de irregularidades e falhas processuais. Isso acarreta maior rigor na investigação por parte desses órgãos. Esse rigor provoca certo melindre, uma espécie de “temor geral” nos setores responsáveis em instruir os processos de dispensa e inexigibilidade de licitação, que acabam sendo também mais rigorosos do que o necessário, vendo embaraço onde ele não existe.

Outro fator que acaba soando negativo é a existência de sortida variedade de profissionais e empresas para o segmento de ensino e capacitação. Provocado pelo “temor geral” acima referido, o fato de haver, no mercado, grande variação de soluções para uma mesma demanda de treinamento, torna nebuloso o correto entendimento sobre questões como singularidade e notória especialização. Assim, uma característica do segmento que deveria ser considerado salutar e proveitoso, no atual cenário, termina por dificultar a instrução dos processos.

A falta de orientação adequada aos servidores envolvidos no processo de contratação, que costumam não possuir conhecimentos básicos sobre as normas que regem as contratações governamentais, como também, o distanciamento entre os setores responsáveis pelas contratações e os órgãos de assessoramento, aumenta ainda mais o abismo existente na maioria dos órgãos e entidades públicas entre os setores de capacitação de pessoal e aqueles ligados diretamente às contratações (setores responsáveis pela elaboração de editais e redação de contratos, assessorias e procuradorias jurídicas). A falta de comunicação entre esses segmentos trava a marcha processual, adiando a providência, além de criar um ambiente organizacional desfavorável à solução dos impasses surgidos no curso de sua instrução. Não é incomum os processos serem desenvolvidos nos departamentos de capacitação (esse desenvolvimento sempre consome precioso tempo) e, ao chegar às mãos da Assessoria Jurídica ou Controle Interno, ser contra indicada ou mesmo indeferida a contratação, retornando o processo para reiniciar a instrução sob novas bases.

Em que pese haver na doutrina alguns excelentes trabalhos de grandes mestres do Direito Administrativo tratando do assunto em apreço, procuraremos, neste trabalho, a partir de uma visão mais pragmática, lançar um pouco mais de luz sobre esse intrincado tema, enfrentando as questões mais delicadas que o envolvem, a fim de ofertar às escolas de governo e setores responsáveis pela capacitação e desenvolvimento de pessoal, bem como às assessorias jurídicas, novos parâmetros para melhor realizar seus respectivos processos de contratação de treinamentos, utilizando de forma segura os mecanismos que a lei põe à disposição do agente público.

 

2 – A importância e o papel da capacitação continuada na organização

Nos dias de hoje a competição entre as empresas e a evolução tecnológica predeterminam, a cada dia, novos rumos nas organizações. Fatores como qualidade e produtividade passam a ser perseguidos com maior afinco pelas corporações de maneira que possam acompanhar o ritmo dessas mudanças. É unânime entre os estudiosos da Ciência da Administração que uma entidade, seja ela pública ou privada, para alcançar resultados cada vez mais positivos, necessita dar atenção ao seu corpo de funcionários. Tratá-los como verdadeiro capital da empresa; capital que precisa ser preservado e mantido atualizado em relação ao seu “valor patrimonial”. Afinal, qualquer instituição é feita de pessoas; por mais mecanizada ou automatizada ela seja, sempre serão as pessoas que farão a diferença no alcance dos objetivos institucionais. Como bem assevera Ulrich[1],

 “O diferencial competitivo para as empresas se constitui de seu capital humano e intelectual, uma vez que o capital humano é a fonte de criação e de inovação. As pessoas compõem a riqueza e o poder das organizações. As máquinas trabalham, mas não inventam”...Como o ser humano é o principal insumo responsável pela competência e sucesso das organizações, torna-se necessário entender como extrair das pessoas seus mais altos níveis de criatividade, inovação, participação e engajamento.

Assim, manter o corpo de funcionários motivado e atualizado com novas tecnologias, novas metodologias e, mais ainda, mantê-los agregados à organização é meio hábil para que esta se mantenha em um ciclo de melhoria contínua, atraindo, via de consequência, melhores resultados. Dentro desse perfil cultural, a medida que mais agrega valor ao capital humano, sem sombra de dúvida, é a capacitação. Por meio dela, a entidade passa a se servir de profissionais mais qualificados, aptos a melhor desempenharem seus papéis, proporcionando ganho de produtividade. Ademais disso, um bom plano de capacitação também funciona como elemento motivador. O profissional submetido à capacitação continuada se sente mais bem cuidado pela instituição que serve; passa a se enxergar peça relevante no processo produtivo na medida em que é tratado como investimento daquela. Se sente responsável por esse investimento e em troca o devolve com seus maiores esforços e com entusiasmo. Profissionais com visão moderna já avaliam o investimento em capacitação feito pelas empresas como um diferencial positivo no momento de optar por uma vaga no mercado de trabalho.

No serviço público não poderia ser diferente, pois a única distinção que se faz em relação às empresas privadas é que estas visam lucro. O avanço dos meios de comunicação, o acesso à informação, o aumento da consciência do cidadão em relação aos seus direitos, bem como o papel que deve desempenhar o gestor público, entre outros fatores, passou a exigir das entidades públicas maior comprometimento com os processos de gestão, pois cumprem funções que interessam a toda sociedade. Ora, nunca se disse que órgão público não precisa ser moderno e eficiente só porque não gera lucro. Ao contrário, é dever do Estado garantir à coletividade cada vez melhores serviços.

Nesse contexto, a capacitação dos servidores representa, tal qual nas empresas privadas, elemento essencial ao alcance desse objetivo. E, penso, no serviço público, essa necessidade é mais gritante, não só pela importância acima referida, mas também pelo fato de que o ritmo da rotatividade profissional é muito inferior do que o anotado nas empresas privadas. De um modo geral, a maioria das carreiras públicas, prende o servidor por décadas, e em boa parte dos casos, vai até a aposentadoria. Por isso, um quadro de servidores que provavelmente receberá pouca oxigenação, precisa estar submetido a programas de treinamento contínuo a fim de que ele seja dotado de condições que lhe permitam, de um lado, acompanhar a evolução da atividade estatal, e do outro, manter-se motivado apesar dos vários anos a serviço do órgão.

 

3 – Licitação: regra geral e exceções

Dito isto, cada órgão ou entidade pertencente ao Poder Público precisa dotar-se de meios que lhes permita cumprir essa missão, promovendo ações de capacitação interna em caráter continuado, criando programas de qualificação profissional entre outras medidas. Para isso, por óbvio, deve se servir da gama de serviços da área de ensino que o mercado oferece. Todavia, não será suficiente apenas planejar de forma coerente as ações de capacitação. Será igualmente importante selecionar o prestador de serviços que atenda aos anseios da Administração.

Conforme visto no capítulo introdutório, na Administração Pública, essa não é uma tarefa das mais fáceis, pois ao contrário dos particulares, o Administrador Público não possui a mesma liberdade de escolha quando necessita realizar compras, contratar serviços e obras ou alienar bens. Para fazê-lo, necessita obedecer a um rigoroso procedimento preliminar preestabelecido na forma da lei. Isto porquanto, na eventualidade de sua escolha vir a ser equivocada, os prejuízos da má gestão serão sentidos por toda a sociedade. Daí porque, a lei impõe a partir de quais critérios serão escolhidos os “parceiros” mais adequados para Administração Pública. Tal comando encontra seu fundamento na Carta Magna de 1988. O art. 37, XXI da Constituição Federal fixa o que chamamos de Princípio do Dever Geral de Licitar:

Art. 37 – Omissis

...

XXXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

Trata-se de regramento geral, mas que, conforme o próprio dispositivo indica no início da sua redação, admite exceções.

Concordando, pois, com a existência de excepcionalidades casuísticas, o Constituinte atribuiu competência para que norma infraconstitucional pudesse discorrer sobre as possíveis hipóteses nas quais seria aceitável o afastamento do dever de licitar. Vez ou outra uma determinada situação de fato poderá indicar que a realização da licitação pública poderá não satisfazer de forma adequada justamente o bem jurídico que visa tutelar, que é o interesse público. Assim, são previstas na Lei Geral das Licitações e Contratos Administrativos, Lei Federal nº. 8.666/93, em seus artigos 24 e 25 as situações em que a Administração poderá deixar de promover o certame licitatório para a contratação de obras, serviços e para as compras, celebrando o contrato de seu interesse por via de adjudicação direta da pessoa do contratado. No primeiro dispositivo, temos os casos de dispensa e, no segundo, o que interessa diretamente a este estudo, os de inexigibilidade de licitação.[2]

Ao contrário das situações de dispensa, em que é possível desenvolver o procedimento licitatório, há casos nos quais, mesmo que se pretendesse realizá-lo, este seria inviável. Essas situações são caracterizadas pela norma licitatória como licitação inexigível. A inexigibilidade de licitação se configura num cenário em que a competição se revela impossível de ser realizada, sendo esta sua marca nodal.

A impossibilidade de submeter o objeto à disputa licitatória não é decorrente de fato externo como nos casos de dispensa. Na contratação emergencial (art. 24, IV), por exemplo, o objeto pode ser perfeitamente licitável, sendo o condutor do afastamento da licitação a situação emergencial (fato externo) e a necessidade de abreviar a providência a fim de evitar-se dano relevante para a Administração; na dispensa para contratação de instituição sem fins lucrativos (art. 24, XIII), o afastamento da licitação deriva da natureza da pessoa do contratado, e não do objeto do contrato, que também poderia ser submetido à disputa. Ao contrário disso, a inexigibilidade surge sempre a partir do específico objeto. O objeto, em si, é ilicitável. Nos casos de dispensa, a autoridade competente pode optar pelo afastamento; na inexigibilidade, não há essa opção.

É verdade que muitas vezes, o objeto é determinado em razão de sua finalidade ou da natureza do negócio[3], e, nesse compasso, um objeto, em princípio, licitável, pode assumir características que venham a inviabilizar a licitação. A construção de um museu, por exemplo, que em princípio não guarda peculiaridade alguma, podendo ter seu projeto licitado normalmente, poderá ganhar contornos especiais se o Município que pretende construí-lo tiver por escopo torná-lo capaz de dar visibilidade e prestígio internacional ou que ele se transforme no novo símbolo da cidade, de forma a incrementar o turismo na cidade. Essa finalidade impõe uma característica que torna o projeto especial, atribuindo-lhe uma marca singular. Assim, a natureza do negócio tornou o objeto — projeto arquitetônico para construção de um museu — peculiar e, consequentemente, ilicitável por impossibilidade de comparação objetiva de propostas. A inviabilidade, portanto, é própria do objeto; em qualquer caso nasce com o objeto a ser contratado. Essa é a lapidar lição de Celso Antônio Bandeira de Mello[4], in verbis:

“São licitáveis unicamente objetos que possam ser fornecidos por mais de uma pessoa, uma vez que a licitação supõe disputa, concorrência, ao menos potencial, entre ofertantes... Só se licita bens homogêneos, intercambiáveis, equivalentes. Não se licitam coisas desiguais. Cumpre que sejam confrontáveis as características do que se pretende e que quaisquer dos objetos em certame possam atender ao que a Administração almeja”.

Considerando, pois, que a inviabilidade de licitação decorre das características do próprio objeto ou do negócio (o que dá no mesmo), seu reconhecimento não será fruto de decisão discricionária do agente competente, como ocorre nos casos de dispensa de licitação. O senso de oportunidade e conveniência da autoridade incidirá apenas na decisão de celebrar ou não o contrato. Caso decida pela contratação, outra alternativa não lhe restará senão reconhecer ser impossível submeter a oportunidade de contratação à competição.

 

4 – A inexigibilidade de licitação fundada no art. 25, II: requisitos e traços marcantes

Importante novamente frisar que é a impossibilidade de submeter à competição que afasta o dever geral de licitar. Essa impossibilidade sempre decorre do objeto, seja porque único, como nos casos de produto exclusivo[5], seja porque, mesmo não sendo exclusivo, se mostra inconciliável com a ideia de comparação objetiva de propostas. E é essa última em que justamente se amolda a hipótese ora em exame. Vejamos o que diz a legislação:

Art. 25 – É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:

...

II – para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;

 

Art. 13 – Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos profissionais especializados os trabalhos relativos a:

I – estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos;

II – pareceres, perícias e avaliações em geral;

III – assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias;

IV – fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços;

V – patrocínio de causas judiciais ou administrativas;

VI – treinamento e aperfeiçoamento de pessoal;

VII – restauração de obra de arte ou bem de valor histórico.

VIII – (Vetado)

 

Como se vê, o art. 25, II da Lei Geral de Licitações reconhece que determinados serviços, os “técnicos especializados”, quando “singulares”, são incomparáveis entre si, ainda que haja pluralidade de soluções e/ou executores. O artigo 13 acima transcrito oferece uma lista de quais serviços são tratados como sendo “técnicos especializados”. O elemento central dessa hipótese de afastamento da licitação é: possível presença de vários executores aptos, mas inviável a comparação objetiva de suas respectivas propostas.[6]

A singularidade é o elemento que torna o serviço peculiar, especial. Não será suficiente que o serviço esteja descrito no art. 13, pois, de per si, não o faz especial (singular). Deve haver, na execução ou em suas características intrínsecas, algo que o torne inusitado. Não se pode confundir singularidade com exclusividade, ineditismo ou mesmo raridade. Se fosse único ou inédito, seria caso de inexigibilidade por ausência de contendores, fulcrada no caput do art. 25, e não pela natureza singular do serviço. O fato de o objeto ser prestado por poucos profissionais ou empresas não impede que estes disputem o objeto. Logo, o fato de haver muitos ou poucos profissionais aptos a executarem o serviço é indiferente para a configuração da singularidade. A inviabilidade de competição decorre, invariavelmente, do objeto.

A despeito de haver opiniões em sentido contrário[7], outro conceito que entendemos equivocado é a de que a singularidade pode decorrer da notória especialização de seu executor. Para essa corrente doutrinária, a notória especialização envolveria uma singularidade subjetiva. Todavia, se imaginarmos que a inviabilidade pode decorrer da pessoa do contratado, teríamos que admitir a absurda ideia de que um mesmo objeto seria, a um só tempo, singular e usual, conforme a pessoa que o executar. Ora, o serviço é ou não é singular. Um projeto arquitetônico para casas populares, desprovido de qualquer complexidade ou vanguardismo técnico, não pode ser classificado como singular apenas porque sua contratação recaiu no escritório de Oscar Niemeyer. O projeto, em si, continuaria usual. Jacoby[8], de forma bastante arguta, salienta que o processo de contratação de obras e serviços inicia-se, necessariamente, pela definição do objeto, o que envolve a elaboração do projeto básico e/ou executivo, e não pela escolha do executor. Acrescenta que “quando os órgãos de controle iniciam a análise pelas características do objeto, percebe-se quão supérfluas foram as características que tornaram tão singular o objeto, a ponto de inviabilizar a competição.”

Enfim, a caracterização da singularidade do objeto dependerá exclusivamente do exame de seu núcleo, isto é, daquele elemento central que materializa a própria execução. Se este se mostrar especial, será considerado como de natureza singular.

Todavia, para configuração da inviabilidade de competição, não bastará que a contratação se amolde em um dos serviços arrolados no art. 13 e que o possa ser caracterizado como singular. Além disso, será imprescindível que o mesmo seja prestado por profissional ou empresa que detenha notória especialização. Somente na presença desses três requisitos, e nessa ordem, é que estará configurada a inviabilidade de competição. A doutrina e a jurisprudência não destoam desse enunciado[9].

 

5 – Os serviços “treinamento e aperfeiçoamento de pessoal”, do art. 13, VI, da L. 8.666/93

A expressão utilizada pela norma geral das licitações não é precisa se considerado o segmento de Gestão de Pessoas. A terminologia hoje existente é variada para significar as mesmas espécies de serviços, só sendo útil mesmo para o campo da Ciência da Administração. Segundo Chiavenato[10], utiliza-se a expressão treinamento, quando se quer indicar uma ação educacional que visa a um resultado rápido, aplicado de forma sistemática, com o objetivo de repassar ou atualizar conhecimentos, habilidades ou atitudes relacionados diretamente à execução de tarefas ou à sua otimização no trabalho; desenvolvimento, quando a ação está associada à ideia de resultados de médio prazo e se propõe a um crescimento cognitivo, emocional e pessoal; e, capacitação, para referir-se a ação educacional, tanto para treinamento como para desenvolvimento. Todas elas são ações que visam desenvolvimento, aperfeiçoamento ou manutenção de competências. O termo aperfeiçoamento é o menos preciso. Na verdade, falar em “aperfeiçoar” significa dizer, no sentido mais puro, que o indivíduo está a caminho da perfeição, o que é uma utopia, pois não é possível alguém pretender chegar à perfeição. Atualmente quase não é empregado, sendo utilizado como sinônimo de desenvolvimento.

Para os fins a que se destina este trabalho, passaremos a empregar a nomenclatura legal, apenas para causar menor dificuldade com o emprego de variadas expressões.

Prosseguindo, não nos parece razoável interpretação restritiva para considerar que o art. 13, VI quis limitar como conceito de serviço técnico especializado apenas as ações de treinamento, devendo ser estendido a todas as ações de educação, em todos os níveis. Assim, qualquer que seja o nome que se dê para o serviço (treinamento, aperfeiçoamento, desenvolvimento, capacitação, ensino) o mesmo estará alcançado pelo inciso VI, do art. 13 da Lei 8.666/93. Estão incluídos nesse contexto a contratação de professores, instrutores e conferencistas quando chamados por via direta (pessoa física); contratação de cursos de extensão (curta ou longa duração), de graduação ou de pós-graduação na forma in company; inscrição em cursos de extensão, de graduação ou de pós-graduação abertos a terceiros na forma presencial ou no sistema EAD.

 

5.1 – Natureza dos serviços de treinamento e aperfeiçoamento de pessoal

Que os serviços acima epigrafados atendem ao primeiro requisito, não resta dúvida, porquanto descritos no inciso VI, do art. 13. Diante disso, o próximo passo será determinar se, e em que casos, tais serviços assumem características singulares a ponto de tornar a licitação inviável. E para esse exame é mister que se faça uma análise sobre o que compõe o núcleo do objeto treinamento, pois é exatamente nele onde se identificará a peculiaridade que poderá torná-lo singular.

Chamamos de núcleo do objeto do serviço a parcela da execução que lhe dá identidade, que materializa a execução. A obrigação principal, que em qualquer serviço é um fazer. No serviço de limpeza, e.g., o núcleo do objeto reside na ação de limpeza propriamente dita (o fazer). A metodologia, a periodicidade, os equipamentos e insumos constituem parte da especificação, mas não é por eles que o serviço se dá por executado, ou seja, sem o fazer o objeto não se materializa. Apenas quando o servente, aplicando a metodologia, seguindo a periodicidade e utilizando os equipamentos e insumos descritos no Termo de Referência, realiza a limpeza é que o serviço se dá por executado. Eis aí o núcleo do objeto limpeza. Ainda no mesmo exemplo, se examinarmos o núcleo do objeto, perceberemos que, qualquer que seja o profissional, a empresa, o local de execução, a região do País em que for executado, o serviço será basicamente realizado da mesma forma. Em outro dizer, aplicando a metodologia e demais especificações, o resultado será idêntico e os objetivos perfeitamente alcançados, independentemente de quem o faça ou onde seja executado. Daí porque não se pode dizer que o serviço de limpeza possui natureza singular. O objeto permite comparação objetiva entre as várias propostas. O mesmo, via de regra, não ocorre nos serviços de treinamento.

Nos serviços de treinamento, a apresentação, objetivos gerais e específicos, publico alvo, metodologia e o conteúdo programático constituem características técnicas do objeto, mas definitivamente não é seu núcleo. O objeto do serviço de treinamento só se materializa com a aula (o fazer). É por meio desta ação que o professor/instrutor, fazendo uso da metodologia diadático-pedagógica, utilizando os recursos instrucionais e aplicando o conteúdo programático, realiza o objeto. Portanto, o núcleo do serviço é a própria aula. Ora, se é a aula, não se pode, em regra, considerar que seja um serviço usual ou executado de forma padronizada; não se pode admitir que, quem quer que seja o executor (o professor), desde que aplicando os recursos acima, obtenha os mesmos resultados. Afinal, como é próprio do humano, as pessoas são diferentes entre si.

Cada professor possui sua técnica própria, sua forma de lidar com grupos, sua empatia, sua didática, suas experiências pessoais, seu ritmo e tom de voz. Tudo isso compõe um conjunto que os tornam incomparáveis entre si. Ademais disso, cada turma, porque composta de pessoas, também possui características que distinguem uma da outra, o que torna cada aula diferente uma da outra. Um grupo maior se comporta diferente de um com menos participantes; uma turma pode ser mais indagadora do que outra; uma turma pode ser heterogênea em relação à experiência e grau de escolaridade. Tudo isso requer do profissional, a cada serviço, a necessária adaptação. Inclusive o próprio professor será diferente a cada aula proferida, ainda que do mesmo tema, pois em um curso ouve uma pergunta de um aluno, que levanta uma questão não imaginada, conduzindo o desenvolvimento do conteúdo a uma vertente não programada; para outra turma, leu um livro ou artigo recém publicado que o leva a pesquisar novamente o assunto tratado e, eventualmente, provocará mudança de visão e conceitos. Quer dizer, as aulas sempre serão diferentes, seja na condução, seja no conteúdo, seja na forma de exposição. Não há como negar que cada aula (cada serviço) é, em si, singular, inusitado, peculiar. Nesse diapasão, vale transcrever excerto do Acórdão 439/1998-Plenário, que será melhor abordado mais adiante, citando lição de Ivan Barbosa Rigolin, em artigo publicado ainda sob a vigência do Decreto-Lei 2.300/86:

“O mestre Ivan Barbosa Rigolin, ao discorrer sobre o enquadramento legal de natureza singular empregado pela legislação ao treinamento e aperfeiçoamento de pessoal (...) defendia que: ‘A metodologia empregada, o sistema pedagógico, o material e os recursos didáticos, os diferentes instrutores, o enfoque das matérias, a preocupação ideológica, assim como todas as demais questões fundamentais, relacionadas com a prestação final do serviço e com os seus resultados - que são o que afinal importa obter -, nada disso pode ser predeterminado ou adrede escolhido pela Administração contratante. Aí reside a marca inconfundível do autor dos serviços de natureza singular, que não executa projeto prévio e conhecido de todos mas desenvolve técnica apenas sua, que pode inclusive variar a cada novo trabalho, aperfeiçoando-se continuadamente.” (Treinamento de Pessoal - Natureza da Contratação in Boletim de Direito Administrativo - Março de 1993, págs. 176/79)

O mesmo não ocorre com os treinamentos cujo núcleo do serviço não reside na aula, mas no método a ser aplicado. Nesses, a intervenção do professor é acessória, não sendo determinante na obtenção dos resultados esperados. A metodologia, sim, é que a responsável pelo alcance desses resultados. Os cursos na metodologia Kumon é um excelente exemplo. Este método preconiza um “estudo individualizado que busca formar alunos autodidatas...com material didático próprio e auto-instrutivo, que permite ao aluno desenvolver os exercícios com o mínimo de intervenção do orientador....”[11] (grifamos). O núcleo do objeto, ou seja, seu elemento essencial é o método e o material didático empregado. Nesse caso, não se vê presente o requisito da singularidade, pois quem quer que seja o orientador, em razão de sua mínima intervenção, serão o método e o material didático os principais responsáveis pela obtenção dos resultados.

Diante do acima exposto, é correto afirmar que, sempre que o núcleo do serviço de treinamento for a aula (o fazer) significará que a atuação do professor será determinante para o alcance dos resultados pretendidos, apontando a natureza singular do serviço. Em contrapartida, caso o método supere a intervenção do mestre, o treinamento não apresentará o elemento da singularidade. Percebe-se que a lógica do dever geral de licitar, em relação a estes serviços se inverte, sendo, a singularidade a regra geral, na medida em que a quase totalidade das ações de capacitação são umbilicalmente dependentes da intervenção do professor. Somente em caráter excepcional é que um treinamento anotará características tão próprias que exigirá menor interferência do orientador.

Para afastar de vez a confusão que ainda persiste existir em relação ao conceito de singularidade, abordemos a situação da contratação de cursos e treinamentos que não são especializados ou originariamente montados para o órgão contratante. Ficamos com um exemplo clássico: Curso de Redação Oficial ou Atualização em Língua Portuguesa.

Ouço com enorme frequência o argumento segundo o qual estes cursos não seriam de natureza singular porque “o tema não é complexo e há muitos professores de português no mercado”. Mais uma vez precisamos insistir que singularidade não é sinônimo de exclusividade ou raridade. Não é a quantidade de oferta de profissionais que indica a presença desse elemento no serviço, mas sim o exame do componente de seu núcleo. Ora, todos nós, em nossa formação, desde o ensino fundamental, lembramos de professores que nos causava entusiasmo e daqueles com os quais aprendíamos com maior dificuldade. Dos que nos despertava interesse sobre a disciplina e daqueles cujo tempo da aula rezávamos para passar mais depressa. Se há professores que alcançam melhores resultados com seus alunos em relação aos seus pares, a conclusão a que se chega não será outra senão a de que, mesmo sendo um curso sobre tema de nível mais elementar, e havendo milhares de professores aptos, se a intervenção do mestre for determinante para o alcance dos resultados desejados, presente estará o elemento singular do serviço.

 

5.2 – Os cursos no sistema EAD

Uma questão atual que se deve levantar é em relação aos cursos no sistema à distância (EAD). A primeira vista, pode-se ter a sensação que pelo fato de ser dependente de recursos de tecnologia da informação e a plataforma ser a mesma para todos os alunos e turmas, teríamos aqui claro exemplo de curso padronizado, portanto, não singular, o que é um grande equívoco. Os recursos tecnológicos, apesar de padronizados, não constituem o núcleo (sempre ele a ser investigado) central do objeto, mas sim, o seu respectivo conteúdo. E este, afinal, é um trabalho predominantemente intelectual. A elaboração do material instrucional e o desenvolvimento do conteúdo (o fazer) são orientados pela perspectiva pessoal do Professor-Conteudista, o qual possui método de trabalho, visão científica e experiência que lhes são próprios. Ademais, os melhores cursos desenvolvidos no sistema EAD são ditados pela a intervenção do tutor como componente determinante na obtenção dos resultados. As orientações sobre dúvidas dos alunos, mediação em fóruns de discussão e a correção de trabalhos é uma atividade igualmente intelectual, e não mecanicamente automatizada. Por conseguinte, assim como os cursos presenciais, os cursos no sistema EAD também guardam, em regra, as características de singularidade, admitindo-se, excepcionalmente, que haja algum nessa sistemática cujo método supere a intervenção do Professor-Conteudista e o do Tutor.

 

6 – A demonstração de notória especialização

Considerando que já foram enfrentados os dois primeiros requisitos para a configuração da inviabilidade de competição na contratação de treinamento e aperfeiçoamento de pessoal, resta avançarmos sobre o último obstáculo. Determinamos o alcance do art. 13, VI, bem como vimos como se detecta o elemento que torna singular o serviço e quando essa singularidade não é verificada, passemos agora desafiar o problema da notória especialização. Avancemos, pois.

Parece-nos suficiente o texto da lei para dar solução a eventuais impasses, mas a prática tem demonstrado que não é bem assim. A primeira vista, tem-se uma falsa ideia de que notório especialista deva ser amplamente conhecido, quase famoso. Lógico que não. Veja-se o texto legal:

Art. 25 - Omissis

...

§ 1º - Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato.

 

Do texto acima transcrito não é possível encontrar nada que chegue perto da ideia de fama ou algo do gênero. Notório especialista é o profissional (ou empresa) que nutre entre seus pares, ou seja, “...no campo de sua especialidade...” a partir do histórico de suas realizações, quer dizer “...decorrente de desempenho anterior...ou de outros requisitos relacionados com suas atividades...” elevado grau de respeitabilidade e admiração, de forma que se “...permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato.”

O parágrafo sub examine indica o norte de quais peculiaridades ou requisitos são considerados idôneos para aferir se um profissional é ou não notório especialista, a saber: “...desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica...”. Mais ainda. A expressão “...ou de outros...” dá bem o tom de rol exemplificativo desses requisitos. O legislador admite, portanto, que outros conceitos e requisitos, não ditados no texto expresso da lei, podem servir de base à conclusão de que o profissional escolhido é o mais adequado à satisfação do contrato. Nota-se também, que a enumeração dos requisitos são alternativos. Significa que não é obrigatório que estejam todos contemplados na justificativa da escolha, bastando apenas o apontamento de um deles para balizar a escolha. É bom que se diga que essa análise deve estar relacionada com as finalidades do objeto. Para Marçal Justen Filho[12] a notória especialização “dependerá do tipo e das peculiaridades do serviço técnico-científico, assim como da profissão exercitada.” Vamos a um exemplo prático retirado de um caso que me foi trazido em sede de consulta.

Determinada Secretaria Estadual de Segurança Pública, ao organizar evento sobre criminalidade e segurança pública, pretendeu contratar um policial civil para proferir uma palestra direcionada aos policiais civis, militares e corpo de bombeiros. O tema seria relacionado a “abordagem policial”. A organização do evento, a cargo do setor de Gestão de Pessoas, pretendeu realizar a contratação com fundamento no art. 25, II c/c 13, VI, da L. 8.666/93.

Chegando o processo na Assessoria Jurídica, não houve dificuldade em reconhecer a presença dos requisitos necessários ao enquadramento legal pretendido, exceto pela não demonstração de notória especialização. Houve, portanto, concordância de que se tratava de um serviço técnico (1º requisito) e que o mesmo tinha natureza singular (2º requisito). Porém, entendeu a douta Assessoria que o profissional escolhido não apresentava nenhum dos requisitos constantes do § 1º, do art. 25, pois era servidor de nível médio, sem nenhum livro ou artigo publicado e sem histórico na atividade docente ou como conferencista.

A organização do evento argumentou que a escolha havia recaído na pessoa do indicado pelo fato de ser ele policial de carreira com mais de 35 anos de atividade policial, sem nenhuma anotação negativa em seus assentamentos, altamente condecorado, muito conhecido e respeitado no meio policial pela sua lisura, ética e retidão no exercício das suas atividades. Acrescentou ainda que a expectativa da organização era no sentido de que, pelo fato de ser policial com larga experiência operacional, suas palavras seriam melhor assimiladas pelo público alvo a que se destinava a palestra.

Ora, como não reconhecer notória especialização no presente caso?! Pouco importava se o profissional tem nível superior ou médio; se já publicou artigos e livros. A palestra era operacional e o palestrante escolhido reunia as condições que permitiam inferir que ele, no caso concreto, era indiscutivelmente mais adequado à plena satisfação dos interesses da Administração. Claro, se a palestra tivesse tema mais complexo, por exemplo, sobre Processo Penal, dirigida a Magistrados, Promotores e Procuradores de Justiça, faltar-lhe-ia requisitos importantes justamente por não se tratar de “seu campo de especialidade”. Mas para esse mesmo público alvo, caso o tema da palestra fosse algo relacionado à atividade operacional do policial, para esse fim, mais uma vez poderia ser considerado notório especialista.

A contratação, ao final, foi efetivada.

 

6.1 – A discricionariedade intrínseca do ato de escolha do profissional ou empresa

Não há discrepância na doutrina, tampouco na jurisprudência, quanto ao entendimento, bastante espancado neste trabalho, de que a singularidade não significa exclusividade. Se assim o fosse, tratar-se-ia de inviabilidade fática de licitação, tal qual o é a aquisição de produto exclusivo, e a contratação fundamentar-se-ia na cabeça do artigo 25 da norma geral de licitações. Logo, para a execução do serviço certamente haverá algumas alternativas dentre as quais uma deverá ser selecionada pela autoridade competente.

José dos Santos Carvalho Filho[13] aponta que a norma não é capaz de ditar com rigor todas as condutas que um agente administrativo deve assumir para exercer as funções que lhe são cometidas. Ante essa impossibilidade, para variadas situações a “própria lei oferece a possibilidade de valoração da conduta”. São os casos em que o agente, para expedir o ato, avaliará, com seu sentir íntimo a conveniência e a oportunidade dos atos que vai praticar porquanto na qualidade de administrador dos interesses coletivos. É exatamente o que ocorre no presente caso.

Ao conceituar “notória especialização”, o dispositivo legal encerra com a expressão “que permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato”. Não restam dúvidas de que essa escolha dependerá de uma análise subjetiva da autoridade competente para celebrar o contrato. Nem poderia ser diferente, pois se a escolha pudesse ser calcada em elementos objetivos a licitação não seria inviável. Ela é impossível justamente porque há impossibilidade de comparação objetiva entre as propostas.

Consequentemente, uma vez que a escolha se dará por meio de uma avaliação subjetiva, ou seja, juízo de valor pessoal de quem detém a competência para realizar a escolha, partir da soma de informações sobre a pessoa do executor (experiências, publicações, desempenho anterior etc), em comparação com esses dados dos demais possíveis executores, nítido está que a escolha é essencialmente discricionária. Será a autoridade competente que, respeitando o leque de princípios a que se submete a atividade administrativa, notadamente, legalidade, impessoalidade, indisponibilidade do interesse público e razoabilidade, e ainda, sopesando as opções à sua disposição, com fulcro em seu juízo de conveniência, indicará aquele que lhe parecer ser o “indiscutivelmente mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato.” Mais uma vez nos socorreremos de excerto do já citado Acórdão 439/98-Plenário, TCU, que traz citação de brilhante lição de Eros Roberto Grau:

“Sobre a prerrogativa da Administração de avaliar a notória especialização do candidato, invocamos novamente os ensinamentos de Eros Roberto Grau, na mesma obra já citada: '...Impõem-se à Administração - isto é, ao agente público destinatário dessa atribuição - o dever de inferir qual o profissional ou empresa cujo trabalho é, essencial e indiscutivelmente, o mais adequado àquele objeto. Note-se que embora o texto normativo use o tempo verbal presente ('é, essencial e indiscutivelmente, o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato'), aqui há prognóstico, que não se funda senão no requisito da confiança. Há intensa margem de discricionariedade aqui, ainda que o agente público, no cumprimento daquele dever de inferir, deva considerar atributos de notória especialização do contratado ou contratada.' (Eros Roberto Grau, in Licitação e Contrato Administrativo - Estudos sobre a Interpretação da Lei, Malheiros, 1995, pág. 77) (grifamos)

 

Em relação a essa afirmação, no mesmo precedente, encontramos as palavras de Jacoby, in verbis:

“Portanto, cabe ao administrador avaliar se determinado profissional é ou não notório especialista no objeto singular demandado pela entidade, baseando-se, para tal julgamento, no desempenho anterior do candidato e nas demais características previstas no § 1º do art. 25 da Lei de Licitações. Quem, senão o administrador, poderá dizer se determinado instrutor é 'essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato', (...) Apenas ele, mediante motivação em que relacione as razões da escolha, poderá identificar no professor ou na empresa contratada os requisitos essenciais impostos pelas particularidades do treinamento pretendido. ('in' Contratação Direta sem Licitação, Brasília Jurídica, 1ª ed., 1995, pág. 306) (grifo acrescentado)

 

É idêntica a posição de Celso Antônio Bandeira de Mello[14], que, com a habitual precisão, esclarece que:

“É natural, pois, que, em situações deste gênero, a eleição do eventual contratado — a ser obrigatoriamente escolhido entre os sujeitos de reconhecida competência na matéria — recaia em profissional ou empresa cujos desempenhos despertem no contratante a convicção de que, para o caso, serão presumivelmente mais indicados do que os de outros, despertando-lhe a confiança de que produzirá a atividade mais adequada para o caso. Há, pois, nisto, também um componente inelimitável por parte de quem contrata.”

 

Não pode, pois, ser subtraído do próprio alvitre da autoridade, e só a ela competirá, a decisão sobre qual notório especialista deva recair a contratação. O que não se admitirá é que a escolha não seja calcada em argumentos que não se direcionem à conclusão de que o escolhido possui notória especialização, nem tampouco que os argumentos sejam flagrantemente desarrazoados; que a escolha seja pautada por um capricho ou uma preferência meramente pessoal. Entre vários professores, a autoridade poderá, sim, optar pelo que se mostrar, em seu sentir, mais adequado, mesmo que seja autor da proposta mais elevada. Porém, não estará livre de apontar as razões pelas quais reconheceu nele o profissional mais adequado.

 

6.2 – Quem detém o notório saber: o professor ou a empresa?

Outro questionamento de ordem prática que é comumente suscitado é o problema de se identificar se é a empresa ou o profissional o detentor da notória especialização. Em princípio, pode parecer um obstáculo de simples solução. É que o art. 25, II da Lei cita ambos a partir do emprego da conjunção alternativa ou (...com profissionais ou empresas...). De fato, a norma admite que possa ser considerado notório especialista tanto o profissional como a empresa. Quanto ao profissional, não há qualquer dificuldade de reconhecimento. Mas em relação à empresa, o assunto é outro.

Há dois tipos de empresa nesse segmento: as empresas de organização de eventos; e, as instituições com objetivo social voltada ao ensino e pesquisa. Nesse último conjunto, há instituições vinculadas ao Poder Público, em geral, fundações, e privadas. E estas últimas, se subdividem entre as que têm e as que não têm fins lucrativos.

Em um primeiro plano, cumpre destacar que a empresa (pessoa jurídica) só pode ser considerada notória especialista quando ela própria for responsável por produção técnica ou científica. É o caso das instituições ou empresas cujo objetivo social é voltado ao ensino e pesquisa, seja ela vinculada ao poder público ou de natureza privada, com ou sem fins lucrativos. Nesses casos, a escolha certamente se dará em função da produção técnica ou científica com a assinatura da instituição, ou seja, aquilo que confere notoriedade para a instituição, tais como, cursos reconhecidos nacional ou internacionalmente, anuários, periódicos, relatórios, pesquisas, além daqueles requisitos exemplificados no §1º do art. 25, II, ou seja, “...organização, aparelhamento, equipe técnica...”.

Mas encontram-se fora do conceito de notória especialização as empresas de organização de eventos[15], porque sua atividade não é singular. Afinal, elas apenas reúnem e coordenam vários serviços para a consecução do objeto (realização do curso), que em medida alguma, só excepcionalmente, seriam considerados singulares, tais como: aluguel de espaço e de equipamentos, impressão de material didático, serviços de Buffet, hospedagem, transporte, entre outros, inclusive, a contratação do profissional que irá ministrar o curso. Não podem, portanto, ser consideradas notórias especialistas. Mas, na prática, isso acaba causando uma perturbação, pois na grande maioria dos casos a escolha se dá em função do profissional, que é de fato o notório especialista, mas o contrato é celebrado em nome de uma empresa de organização de eventos. Ora, se estas empresas não podem ser consideradas notórias especialistas, como seria possível justificar apontar a singularidade do serviço e a notória especialização do profissional, mas assinar contrato com a empresa? Para melhor entender e dar solução correta a esse impasse, antes, é preciso conhecer um pouco do mercado de treinamento.

O segmento de treinamento de pessoal é muito vasto. Há incontáveis empresas, instituições e profissionais para as mais diversas áreas. A contratação pode ser realizada com empresas ou diretamente com os profissionais. Mas de um modo geral, raramente os profissionais são contratados diretamente como pessoa física, mediante Recibo de Pagamento a Autônomo-RPA. Duas são as razões. De um lado, para o contratante sai mais dispendioso, pois além dos honorários, o contratante deve recolher 20% da remuneração ao INSS, o que eleva a despesa total. Assim, os órgãos evitam contratar por essa forma. Por outro lado, para o profissional também é desinteressante. Quando contratado diretamente pelos órgãos costumam ser orientados a incluir no valor dos honorários, as despesas relativas a transporte, estadia, alimentação e todas as demais necessárias ao cumprimento do contrato. Essas despesas são, portanto, antecipadas com recursos do próprio profissional para somente serem ressarcidas ao tempo do adimplemento da Administração. Cediço que é, infelizmente, os atrasos de pagamento provocados pelos órgãos da Administração Pública, o risco da contratação passa a ser extremamente elevado. Daí porque os profissionais, em sua maioria, evitam a contratação nesses moldes. A forma mais comum de contratar o profissional é por intermédio de empresas de organização de eventos. A pergunta que se faz é: como justificar a contratação? A resposta pode estar no próprio art. 25 da Lei 8.666/93, em seu inciso III.

Já ficou assente que a inexigibilidade de licitação aqui tratada se funda na impossibilidade de comparação objetiva das propostas. Em outro dizer, que a seleção da proposta mais vantajosa, necessariamente, far-se-á por critérios de ordem valorativa de cunho pessoal do agente competente (ato discricionário). Teleologicamente, é a mesma origem do reconhecimento da inviabilidade de competição para contratação de profissionais do setor artístico, isto é, impossibilidade de comparação objetiva entre as possíveis propostas. Realmente, se uma Prefeitura quer contratar um(a) cantor(a) ou banda popular para animar a festa de aniversário da cidade, não teria como estabelecer critérios objetivos para avaliar as várias propostas dos mais diversos artistas, inclusive com estilos musicais também variados.

Mas veja-se que o art. 25, inciso III, autoriza a contratação do artista não só por via direta, mas também “... através de empresário exclusivo...”. Por analogia, a mesma solução pode ser conferida à contratação de professores, quando contratados por intermédio de empresas de organização de eventos. Não é desarrazoado reconhecer que o docente atuará mediante intermediação, exatamente como é comum na classe artística. Entendo que a situação é mais que análoga; é quase idêntica a dos profissionais do setor artístico. Como o cerne da inexigibilidade é o mesmo, não haveria óbice algum na contratação do profissional através de seu empresário, in casu, as empresas do ramo de organização de eventos. Não que o professor contratado tenha que demonstrar ser exclusivo de forma permanente de uma certa empresa de organização de eventos. Mesmo porque isso é quase inexistente no mercado. Mas, para o projeto específico, alvo da contratação, sem dúvida, atuará em caráter de exclusividade. Uma exclusividade relativa. Mas, uma exclusividade.

Poder-se-ia defender que a tese da “exclusividade relativa” ora proposta não é totalmente adequada sob o argumento de que um único professor por trabalhar para várias empresas de organização de eventos, poderia figurar em várias propostas (de suas várias parcerias). Seguindo esse raciocínio, também seria admissível caber licitação, posto que haveria, em tese, vários contendores para o mesmo objeto (conteúdo e professor). Definitivamente não.

De fato, a realidade do mercado nesse segmento profissional possui essa configuração. Cada professor/conferencista atua ao lado de mais de uma empresa ou instituição. E é também verdade que, com extrema frequência, os órgãos, na fase interna da contratação, sobretudo, na fase de cotação de preços, acabam por receber propostas de várias empresas, tendo o mesmo profissional como âncora do projeto. Ocorre que a escolha por qual empresa esse profissional irá atuar, caso aceite o projeto, é do exclusivo alvitre dele próprio, e não das empresas pelas quais habitualmente atua. Ele é quem decidirá, ao seu talante, se aceitará ou não o projeto e qual empresa o intermediará junto ao contratante. Assim, mesmo podendo haver várias propostas, ao optar pela empresa que melhor lhe atenda, estará, o profissional, a conceder à sua escolhida, uma exclusividade relativa.

 

6.3 – A criteriosa escolha do profissional ou empresa

Reconhecendo que a eleição do profissional é uma decisão essencialmente discricionária, mas que, ao mesmo tempo, deve fundar-se em argumentos razoáveis, relevantes e verídicos, ao comparar-se os profissionais, ver-se-á que mais de um reúne excelentes condições de execução do objeto. Após a análise dos requisitos que o §1º, do art. 25 enumera (não se nega que são exemplificativos, ao mesmo passo que constituem eficiente bússola a orientar a análise) a indicação poderá ser direcionada por razões, que, talvez, isoladamente, não seriam suficientes para tanto. Sejamos práticos.

Digamos que um hospital público pretenda contratar um professor para ministrar curso de elaboração de termo de referência destinado aos servidores das áreas técnicas responsáveis pela especificação de insumos e equipamentos médico-hospitalares. Em pesquisa, verificou-se que há vários ótimos profissionais no mercado, com formação acadêmica, publicações importantes e vasta experiência docente no tema e com ótimas avaliações, estando três deles disponíveis para o projeto. Em qual deles poderia recair a escolha? Qualquer um. Assim, a autoridade competente terá que traçar algum parâmetro que justifique sua decisão. Dentre os três profissionais disponíveis um demonstrou ter ministrado anteriormente o treinamento em tela em hospitais públicos. Poder-se-ia justificar sua escolha exatamente por esse aspecto. A autoridade competente poderia inclinar-se licitamente na direção deste, sob a justificativa de que “dentre os profissionais disponíveis, este seria o mais adequado por ter vivenciado a experiência de ministrar cursos em órgãos da Saúde Pública, o que permite inferir que sua expertise docente conta com o conhecimento das peculiaridades inerentes aos produtos e equipamentos que habitualmente são adquiridos em hospitais públicos.

 

7 – Inscrição em cursos abertos a terceiros

Esse tema quase não encontra tratamento específico na doutrina. No âmbito do Tribunal de Contas da União, os precedentes não chegam a esgotar o assunto. A referência mais importante que se tem junto à Corte Federal de Contas é a do já referido Acórdão 439/1998-Plenário. No voto da lavra do Min. Adhemar Paladini Guisi, restou consignado que:

“Retomando à proposta de decisão em estudo, consideramos desnecessário firmar entendimento quanto à inexigibilidade de licitação para inscrição de servidores em cursos abertos a terceiros. Os cursos abertos para os quais não cabe licitação são aqueles inusitados, quer por não haver previsão de sua repetição, quer pela indiscutível notoriedade do instrutor, ou ainda aqueles oferecidos por uma única empresa. Em todos os casos o texto da Lei é suficientemente claro: há inviabilidade de competição. Para os cursos regularmente oferecidos por mais de uma empresa, não há que se falar em inexigibilidade, pois não há singularidade no objeto e, portanto, a competição é perfeitamente possível. O que pode ocorrer é o desinteresse dos prestadores do serviço em participarem de certame licitatório, o que caracterizaria a hipótese de dispensa de licitação prevista no inciso V do, art. 24 (licitação vazia).”

 

Nada obstante o reconhecido saber do ilustrado Ministro, sou forçado a discordar em parte. Estou de pleno acordo com o trecho em que diz que “...Em todos os casos o texto da Lei é suficientemente claro: há inviabilidade de competição.” Mas entendo que por motivos outros, não aqueles expostos no douto voto.

Em primeiro lugar, não é correto afirmar que há inviabilidade de competição para cursos abertos a terceiros “...quer por não haver previsão de sua repetição...”, porque há numerosos casos de cursos que se repetem ao longo do ano em várias cidades e com várias empresas. Também é equivocado reconhecer que a inviabilidade de competição é fruto da “...indiscutível notoriedade do instrutor...”, em virtude de tudo o que já foi dito acima sobre o fato de que a notória especialização não precede a singularidade do objeto, mas o contrário. Quanto aos cursos “...oferecidos por uma única empresa...” estar-se-ia falando de inviabilidade por ausência absoluta de competidores, com fundamentação legal no art. 25, caput, mas com procedimentos de justificativa análogos ao do art. 25, I, o que exigiria da empresa organizadora uma declaração ou certidão de exclusividade. Não é o que está sendo aqui tratado.

Realmente, o texto da Lei é suficiente para a hipótese de inscrição de servidores em cursos abertos. É inviável a competição em razão de ser, aquele evento, específico, único. Pode haver programação do mesmo tema, com o mesmo instrutor, pela mesma empresa, na mesma cidade, mas ainda sim, cada qual será único. Os vários cursos, ainda que idênticos, representam objetos apenas assemelhados, porém, distintos. Não se pode cogitar no sentido de que há várias opções intercambiáveis. Argumentar que o curso pretendido se repetirá ao longo do ano, não é convincente, pois constituem objetos não cotejáveis. Uma prova disso é que não é possível garantir que um curso aberto venha a ser realizado, pois depende de quórum mínimo para sua confirmação. Portanto, jamais poderiam ser postos em comparação e disputa.

Assim, para cursos abertos a terceiros, penso que a fundamentação correta é na cabeça do art. 25 da lei geral das licitações e não em seu inciso II c/c art. 13, VI. Antes mesmo de ser caso de singularidade e de demonstração de notória especialização, é hipótese de inviabilidade absoluta de competição. A notória especialização do palestrante/instrutor pode servir de lastro para a justificativa da escolha daquele específico evento, para acomodação do ato em relação aos princípios de direito a que se submetem todos os agentes públicos. Mas não integra, necessariamente, a fundamentação jurídica do afastamento do dever geral de licitar.

Diante disso, podemos afirmar que é inexigível a licitação para inscrição de servidor em curso aberto a terceiros, por absoluta inviabilidade de competição, na esteira do art. 25, caput, da Lei 8.666/93.

 

8 – Entendimento do TCU sobre o tema

O dilema da contratação de cursos, professores, conferencistas no âmbito da Administração Pública não é recente e há muito vem sendo alvo de debates no meio doutrinário e no âmbito do controle externo.

O primeiro enfrentamento de maior destaque junto ao Tribunal de Contas da União está consignado na Decisão 535/1996, cuja relatoria ficou a cargo do Min. Paulo Afonso. Provocada por meio de representação interposta pelo Instituto Sezerdello Correa-ISC, escola de contas do TCU, o Plenário deliberou autorizar o ISC a promover o procedimento conhecido como credenciamento[16], visando pré-qualificação de professores para contratações futuras, nas vezes em que a escola necessitar, com arrimo no art. 25, caput:

“O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator, DECIDE: 1 - autorizar o Instituto Serzedello Corrêa a proceder ao cadastramento de docentes para ministrarem treinamento/aperfeiçoamento na área-fim do Tribunal; 2 - autorizar o ISC a proceder, sempre que necessário, à contratação direta, por prazo determinado, dos docentes previamente cadastrados e selecionados de acordo com o currículo, dando-se preferência aos professores do local onde será realizado o treinamento/aperfeiçoamento; 3 - autorizar o Instituto a proceder, nos demais casos, a licitações para a contratação de instrutores, realizando, dado o conteúdo didático de cada disciplina, um certame licitatório para cada conjunto de cursos de uma mesma disciplina; 4 - determinar a inclusão da presente Decisão, bem como do Relatório e Voto que a fundamentam, na Ata da Sessão Ordinária realizada nesta data.”

 

Como se vê do decisum acima transcrito, naquela assentada, o Relator houve por bem distinguir duas espécies de treinamento: a) cursos área-fim; e, b) cursos área-meio. Desse modo restou consignado que os cursos que fossem destinados aos servidores atuantes da área-fim do Tribunal, deveriam ser contratados sem licitação fulcrado no art. 25, II e §1º. c/c art. 13, VI da Lei 8.666/93, por reconhecer, somente a estes treinamentos, a característica da singularidade, bem como a necessidade de serem ministrados por profissionais de notória especialização. Já os cursos destinados à área-meio deveriam ser ordinariamente licitados, segundo o entendimento do relator, em síntese, por não apresentarem nenhuma característica que os torne singular.

Essa divisão em categorias como elemento justificador do afastamento do dever geral de licitar não resolve o impasse. Basta imaginar que o mesmo curso seria ilicitável em um órgão, em virtude de ser-lhe específico de sua área finalística e, em outro, seria cabível a licitação, por ser relativo à atividades auxiliares. Sob essa visão, um treinamento destinado aos médicos e enfermeiras de um hospital público, visando capacitação na triagem e diagnóstico da dengue seria singular a exigir a contratação de notório especialista; mas se o mesmo curso fosse ministrado para os médicos e enfermeiras do Departamento de Saúde, de um Tribunal de Justiça, o curso seria licitável. Já vimos e revimos que a singularidade dos serviços se prende ao próprio objeto. Ora, ou o objeto é singular ou não é. Não é possível imaginar o mesmo treinamento, destinado ao mesmo público alvo, possa ser, ao mesmo tempo, licitável e inexigível.

Posteriormente, a Corte Federal de Contas voltou a enfrentar o problema a partir de denúncia sobre eventuais ilegalidades cometidas pelo TRT da 16ª Região na contratação de cursos para seus servidores nos anos de 1995 e 1996. Na oportunidade, o eminente, Min. Carlos Átila, abandonando a tese da relativização dos cursos em relação à sua área de aplicação, passa a enxergar a questão sob outro ângulo, inclinando-se pela não adoção de procedimento licitatório para contratos dessa natureza, conforme o excerto extraído de seu voto, abaixo transcrito:

“(...)Considero muito pouco razoável fixar, mediante interpretação rígida e estrita da Lei, barreiras convencionais desnecessárias para o trabalho dos administradores dos programas de capacitação dos servidores públicos. Bastam as enormes dificuldades naturais que já se antepõem à sua tarefa - como é o caso, precisamente, da escassa disponibilidade de mestres e instrutores qualificados, experientes, e com boa didática para transmitirem conhecimentos aos treinandos. Assim, tanto para a contratação de professores e instrutores para ministrar aulas em cursos organizados pelo próprio órgão, quanto para pagar a matrícula e participação de servidores em cursos especializados, organizados por terceiros e abertos à inscrição de outros interessados - em ambos os casos - entendo que se caracteriza a inviabilidade de competição prevista no item II do art. 25, combinado com o item VI do art. 13 da Lei das Licitações, sendo assim facultado aos administradores considerar, se assim o entenderem, inexigível o processo de licitaçäo.(...)” (TCU, Decisão 747/1997, Rel. Min. Carlos Álvares da Silva)

 

Encaminhou seu voto ao Plenário da Corte com a seguinte proposta de decisão:

“(...)8.2. considerar enquadramento na hipótese de inexigibilidade de licitação prevista no inciso II do art. 25, combinado com o inciso VI do art. 13, da Lei nº 8.666/93, a contratação de professores, conferencistas ou instrutores, para ministrar aulas em cursos de treinamento, de formação ou de complementação de conhecimentos especializados de servidores, bem como para sua inscrição em cursos abertos a terceiros, destinados ao ensino de matérias especializadas, sempre que não se trate de treinamento baseado em técnicas e métodos padronizados de ensino;(...)”

 

O Plenário, mesmo não acolhendo a proposta de decisão, deliberou da seguinte forma:

“O Tribunal Pleno, ante as razões expostas pelo Relator, DECIDE: 1. conhecer da denúncia em pauta por atender aos requisitos de admissibilidade previstos no caput do art. 213 do Regimento Interno para, no mérito, considerá-la improcedente; 2. remeter cópia do Relatório e Voto, da Decisão não acolhida, bem como desta Decisão, à SEGECEX, para que, no prazo de até sessenta (60) dias, coordene estudo e apresente conclusões sobre a matéria constante do item 8.2 da Decisão não acolhida, para posterior deliberação do Tribunal;(...)”

 

A decisão acima gerou estudos que culminaram na Decisão 439/1998, cuja relatoria coube ao Min. Adhemar Paladini Ghisi, e que se tornou um divisor de águas sobre a matéria. A Secretaria Geral de Controle Externo do Tribunal, unidade técnica designada para conduzir os estudos, chegou à conclusão de que, na imensa maioria dos cursos, a intervenção do instrutor é determinante para a obtenção dos resultados pretendidos, sugerindo, ao final, como proposta de decisão, que a Corte fixasse o entendimento de que “...se enquadra na hipótese de inexigibilidade de licitação prevista no inciso II do art. 25, combinado com o inciso VI do art. 13, da Lei 8666/93 a contratação de professores, conferencistas ou instrutores, para ministrar aulas em cursos de treinamento, de formação ou de complementação de conhecimentos de servidores especializados,...”. Mas assim o fez limitando o entendimento apenas em relação àqueles treinamentos que fossem desenvolvidos de modo específico para a unidade contratante, ou ainda aqueles voltados para as peculiaridades dos prováveis treinandos. Prosseguindo na proposta de encaminhamento, também entendeu ser perfeitamente possível a realização de certame licitatório nos casos de cursos “...baseados em programas convencionais ou dirigidos a servidores não especializados...”, por entender que, nestes casos, não existe o elemento da singularidade.

Nada obstante, o entendimento do relator foi ainda mais longe, aduzindo que

“...a inexigibilidade de licitação, na atual realidade brasileira, estende-se a todos os cursos de treinamento e aperfeiçoamento de pessoal..e que a inexigibilidade de licitação para contratação de treinamento e aperfeiçoamento de pessoal, na atualidade, é regra geral, sendo a licitação exceção.”

 

Acompanhado à unanimidade pelo Pleno, o TCU fixou o seguinte entendimento:

 “O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator, DECIDE: 1. considerar que as contratações de professores, conferencistas ou instrutores para ministrar cursos de treinamento ou aperfeiçoamento de pessoal, bem como a inscrição de servidores para participação de cursos abertos a terceiros, enquadram-se na hipótese de inexigibilidade de licitação prevista no inciso II do art. 25, combinado com o inciso VI do art. 13 da Lei nº 8.666/93; 2. retirar o sigilo dos autos e ordenar sua publicação em Ata; e 3. arquivar o presente processo.

 

Em que pese a força dos argumentos expendidos ao longo do extenso e brilhante voto em apreço, bem como dos luminares mestres citados no relatório que lhe deu supedâneo, enxergo, com as devidas vênias, que este entendimento merece as pequenas reformas aqui propostas.

Como dito antes, também partilhando do entendimento de que na contratação de cursos, a regra é a inexigibilidade e a licitação a exceção, penso que o ponto de referência deva ser o grau de interferência do instrutor para o alcance dos resultados pretendidos no treinamento. Reconhecendo a existência (em via de exceção) de cursos cuja metodologia didático-pedagógica torna a intervenção do instrutor menos determinante na obtenção dos resultados, penso que não se deva generalizar da forma como decido pelo Egrégio Tribunal de Contas da União. Todo o processo de contratação de cursos deve exigir da autoridade competente seu correto enquadramento legal, com demonstração da presença inequívoca de todos os requisitos legais (explicitação da característica singular do serviço, demonstração de notória especialização e justificativa da razão da escolha do executor dentre as alternativas possíveis). A generalização reconhecida na Decisão 439/1998, que considera presumidamente singulares todos os cursos, pode conduzir ao enfraquecimento da instrução do processo na medida em que torna quase desnecessária a caracterização do serviço como sendo singular.

Também considero pouco correta a fundamentação no art. 25, II c/c 13, VI da Lei 8.666/93 para inscrição de servidores em cursos abertos. Como suso defendido, a licitação para os cursos abertos é inviável, antes, pelo fato de que, cada um, é único. Claro que em boa parte dos casos, o curso aberto também poderá ser enquadrado no dispositivo acima quando prestado por notório especialista. Mas sendo ou não singular, sendo ou não prestado por notório especialista, por exemplo, um curso aberto na metodologia Kumon, este seria ilicitável pelas extensas razões aqui já defendidas. Daí porque a melhor solução para contratos dessa natureza é fundamentar o afastamento no art. 25, caput.

Por fim, é bom que fique claro que apesar de ter sido proferida há mais de 14 anos, a Decisão 439/1998 ainda continua balizando as decisões da Corte Federal de Contas, como se vê, apenas a título de ilustração, os seguintes precedentes: Acórdão 654/2004 - Segunda Câmara Rel. Min. Lincoln Magalhães da Rocha; Acórdão 1886/2007 - Segunda Câmara Rel. Min. Marcos Bemquerer; Acórdão 1247/2008 – Plenário Rel. Min. Marcos Bemquerer; Acórdão 1762/2011 - Segunda Câmara Rel. Min. Augusto Sherman

 

9 – Impossibilidade de utilização de dispensa em substituição à inexigibilidade de licitação

Nos processos de contratação direta, não é incomum a ocorrência de casos em que uma mesma demanda de interesse público possa vir a ser atendida por meio de mais de uma hipótese legal de afastamento do certame obrigatório. Se há um vazamento em uma parede de um banheiro, seu reparo, sem dúvida, é um caso emergencial (art. 24, IV), pois a considerar que o vazamento aguarde a deflagração e conclusão de um torneio licitatório, os prejuízos decorrentes podem se tornar insuportáveis. Mas esse reparo pode não ser tão dispendioso e seu custo permanecer no limite da dispensa de licitação em razão do valor (art. 24, I). A contratação do reparo poderia ser formalizada por qualquer um dos dois fundamentos. Salientamos acima que um curso aberto a terceiros é inexigível por não haver como ser cotejado com outro, por tratar-se de objeto único, mas também não se afasta a idéia de que pode tratar-se de um curso cuja intervenção do instrutor seja determinante para o alcance dos objetivos e ser apresentado por profissional notório especialista. A inscrição do servidor poderia ser amparada tanto no art. 25, caput como no art. 25, II c/c art. 13, VI, todos, da Lei 8.666/93. A despeito disso, não será possível que um caso inexigibilidade também possa ser enquadrada como dispensa de licitação. Uma não pode ser alternativa à outra. Em um exemplo prático, não é correto contratar a inscrição de um servidor em um curso aberto na dispensa de licitação em razão do baixo valor (art. 24, II). A razão é simples.

Já dissemos que o traço distintivo entre os institutos da dispensa e da inexigibilidade de licitação reside no fato de que, no primeiro, a licitação é uma opção, ou seja, é perfeitamente viável; no segundo, ela é impossível. Por isso é correto afirmar que, nos casos de dispensa, a licitação chega a ser instaurada, para, caso a autoridade assim decida, ser afastada (dispensada) por decisão de mérito administrativo. Na inexigibilidade, a licitação sequer é instaurada, pois impossível. Portanto, um objeto cuja licitação é inexigível não pode ser contratado, alternativamente, por dispensa de licitação posto que esta admite a licitação. Ora, ou a licitação é impossível, ou é possível. Ambos, jamais! Veja-se o perspicaz apontamento de Celso Antônio Bandeira de Mello[17], ao conceituar a inexigibilidade de licitação, verbis:

“Segue-se que há inviabilidade lógica deste certame, por falta de seus ‘pressupostos lógicos’, em duas hipóteses: a) quando o objeto pretendido é singular, sem equivalente perfeito...b) quando só há um ofertante. Em rigor, nos dois casos cogitados, não haveria como falar em ‘dispensa’ de licitação, pois, só se pode dispensar alguém de um dever possível. Ora, em ambas as situações descritas a licitação seria inconcebível.” Celso Antônio Bandeira de Mello, p.498.

 

Nada obstante, é fato corriqueiro nos órgãos públicos a inscrição de servidores nos cursos abertos com fundamento no art. 24, II, isto é, na dispensa de licitação em razão do valor, o que vem a ser completamente equivocado, além de atrair alguns inconvenientes operacionais.

Uma das irregularidades mais encontradas pelo controle externo é a dispensa de licitação com a caracterização do chamado “fracionamento ilegal de despesa”, no qual o órgão realiza diversas contratações, deixando de por em prática a licitação que seria correspondente ao conjunto de contratos que poderiam ser contratados concomitantemente. Como os limites financeiros da dispensa do art. 24, I e II são de observância rigorosa, ao sustentar a inscrição nesse fundamento legal, o órgão fica impedido de formalizar despesa superior ao limite legal, impedindo, o mais das vezes, a capacitação do número de servidores que o órgão necessita qualificar.

Em muitos casos esse procedimento é desenvolvido apenas e tão somente em virtude da menor burocracia exigida para esse caso de dispensa em relação aos demais casos de contratação direta, sobretudo, os de inexigibilidade. De um modo geral, as dispensa de licitação para contratos de pequena monta, encontram caminhos mais facilitados nas rotinas administrativas, o que não ocorre para o restante dos casos de contratação direta. A principal delas é a isenção da obrigação de publicação do ato de ratificação na imprensa oficial, conforme redação do art. 26, da L. 8.666/93[18], que além de muito dispendiosa, poderia se tornar um entrave na contratação.

A respeito desse aspecto, o Tribunal de Contas da União, ao apreciar representação[19] interposta pela Secretaria de Material, Patrimônio e Comunicação Administrativa do TCU- SEMAT, contestando orientação da Secretaria de Controle Interno do TCU - SECOI, ambos os setores internos da própria Corte de Contas, firmou entendimento no sentido de que não faria sentido que os contratos celebrados com dispensa de licitação ou inexigibilidade que permanecessem abaixo dos limites financeiros da dispensa dos incisos I e II do art. 24, tivessem sua eficácia condicionada a um procedimento cujo valor seria incompatível com a despesa em si, decidindo da seguinte forma:

(...) 9.2. determinar à Secretaria de Controle Interno do TCU que reformule o “SECOI Comunica nº 06/2005”, dando-lhe a seguinte redação: “a eficácia dos atos de dispensa e inexigibilidade de licitação a que se refere o art. 26 da Lei 8.666/93 (art. 24, incisos III a XXIV, e art. 25 da Lei 8.666/93), está condicionada a sua publicação na imprensa oficial, salvo se, em observância ao princípio da economicidade, os valores contratados estiverem dentro dos limites fixados nos arts. 24, I e II, da Lei 8.666/93”.

 

Assim, todo contrato amparado em um dos dispositivos legais que autorizam o afastamento do dever geral de licitar cujo valor total não ultrapassar os limites do art. 24, I e II ficam desobrigados da publicação de que trata o art. 26 da mesma Lei. Via de consequência, não se deve concluir, do julgado acima, que o TCU reconhece a possibilidade do duplo enquadramento, como muitos ainda pensam, ou seja, sempre que a despesa ficar abaixo dos limites financeiros ditados no art. 24, I e II, neles poder-se-ia fundamentar a contratação, qualquer que fosse o pressuposto da contratação direta. Errado. O que é inexigível deve continuar sendo tratado como tal; a contratação emergencial, como emergencial deve ser instruída, e assim por diante, não importando o valor do contrato. Nesse diapasão, colhemos trecho da Declaração de Voto no mesmo precedente da lavra do Min. Augusto Scherman Cavalcanti que põe uma pá de cal sobre o assunto, verbis:

“Assim, ante as mesmas razões, concordo com o nobre Relator em privilegiar a economicidade também nos casos de dispensa previstos nos incisos de III a XXIV e de inexigibilidade previstos no art. 25 da Lei 8.666/93, cujos custos se encontrem dentro dos limites prescritos nos incisos I e II do art. 24 da mesma Lei. Penso, contudo, deva restar claro que, nas hipóteses de dispensa (incisos III a XXIV do art. 24) e de inexigibilidade (art. 25) de baixo valor, embora a eficácia do ato, em face do princípio da economicidade, não fique vinculada à publicação dele na imprensa oficial, os demais requisitos do art. 26 e de seu parágrafo único (como a apresentação de justificativas e o encaminhamento do ato à autoridade superior no prazo indicado para ratificação), bem como os requisitos específicos que caracterizam as aludidas espécies de dispensa e a inexigibilidade, devem ser mantidos e criteriosamente observados.”

 

Para os serviços de que se cuida o presente trabalho, não se deve utilizar a dispensa do art. 24, I e II para contratar inscrição de servidores em cursos abertos. A acomodação legal correta é o art. 25, caput. Esse posicionamento poderá suscitar uma reflexão sob o prisma da aparente fuga ao dever de licitar, ou violação ao princípio da moralidade, pois, adotando a tese ora defendida, um órgão poderá inscrever em um único curso aberto número ilimitado de servidores, o que é verdade. Mas esse não seria o argumento válido para obstar a inscrição abrigada no art. 25, caput, mas sim o exame de razoabilidade do ato da autoridade competente, que deverá vir balizada por análise de oportunidade e conveniência em encaminhar muitos servidores a um curso aberto, diante da alternativa de realizar treinamento fechado, inclusive sob o especial apreço ao impacto financeiro de ambas as possibilidades. Muito embora seja regra excepcional, os dispositivos que permitem a não licitação foram inseridos no ordenamento jurídico para serem utilizados sem receio do agente público, apenas com os devidos cuidados. Com essa inclinação, veja-se o teor da lição de Jacoby[20] em excelente trabalho disponibilizado na rede mundial de computadores:

“Não é vedado contratar notórios especialistas: ao contrário, em várias é a única hipótese em que o interesse público poderá ser efetivamente satisfeito, residindo nesse ponto angular a força imanente do comando legal, justificadora da exceção ao princípio constitucional da licitação.”

 

Do mesmo modo, se o objeto apresentar as características que o torne singular, não será viável, também sob o aspecto lógico, a utilização do art. 24, VIII ou XIII[21] para contratação dos serviços aqui estudados, ainda que a pessoa do contratado seja, no primeiro caso, órgão ou entidade pertencente à Administração Pública, ou, no segundo uma instituição sem fins lucrativos com objetivo social voltado ao ensino ou pesquisa, porquanto ser ilógico admitir que algo possa ser, a um só tempo, singular ou exclusivo e licitável.

 

10 – Conclusão

Destarte, com base no que foi aqui exposto, podemos sintetizar a contratação de serviços de treinamento e aperfeiçoamento de pessoal, nas mais variadas formas, no âmbito dos órgãos e entidades da Administração Pública, com as seguintes conclusões:

a)   a inexigibilidade fundada no art. 25, II da Lei 8.666/93 depende da conjugação de três requisitos, a saber: ser um dos serviços arrolados no art. 13 da mesma Lei; possuir características que o torne singular; e, ser prestado por notório especialista;

b)   os serviços de treinamento e aperfeiçoamento de pessoal encontram-se discriminados no inciso VI, do art. 13;

c)    nos serviços de treinamento e aperfeiçoamento de pessoal, a determinação da singularidade está relacionada ao núcleo do seu objeto, que é a aula;

d)   como a aula é uma atividade humana (não mecânica) e os variados docentes são incomparáveis entre si, sempre que a intervenção destes for determinante para a obtenção dos resultados pretendidos, o serviço será singular;

e)   tais serviços são, em regra, singulares, salvo aqueles cujo método supere o docente na obtenção dos resultados esperados;

f)     na contratação de cursos, a escolha da pessoa do executado é ato discricionário e exclusivo da autoridade competente, que deverá apontar as razões que o fizeram inclinar-se por este ou aquele profissional ou empresa;

g)   cursos abertos a terceiros são sempre ilicitáveis pelo fato de ser objeto único que se esgota com a execução, devendo ser contratados com base no art. 25, caput da Lei Geral de Licitações;

h)   não é viável contratar por dispensa de licitação um objeto que, por sua natureza, seja exclusivo ou singular, ainda que aparentemente presentes os requisitos da hipótese de dispensa;

Acrescento, por fim, que o presente trabalho foi desenvolvido a partir da experiência que vivencio diuturnamente, tanto na qualidade de palestrante e docente em cursos abertos e na modalidade in company, como na de servidor público incumbido das funções ligadas às contratações governamentais. Como testemunha das enormes dificuldades encontradas pelos servidores que exercem, em suas respectivas unidades administrativas, a função de planejar e executar as ações de capacitação de seu quadro de pessoal vi-me no dever de debruçar-me nestas laudas as quais, espero, ao menos ser capaz acrescentar elementos positivos ao debate e à evolução da matéria.

Essa foi a visão que me serviu de norte.

 

[1] ULRICH, Dave. Os campeões de Recursos Humanos: Inovando para obter os melhores resultados. 6. ed. São Paulo: Futura, 1998

[2] A doutrina reconhece ainda uma terceira modalidade de afastamento do dever geral de licitar, fulcrada no art. 17, da Lei, chamada de licitação dispensada. Deixamos de fazer referência a essa por tratar-se de desobrigação de licitação para as alienações de imóveis.

[3] Nesse sentido, FIGUEIREDO, Lucia Valle e FERRAZ, Sérgio, Dispensa e Inexigibilidade de Licitação. São Paulo: Malheiros, 1994, p.102. Vera Lúcia Machado D´Avila, in DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella (org.) Temas Polêmicos sobre Licitações e Contratos. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 127 admite que a inexigibilidade pode também advir da pessoa do contratado, com o que discordamos.

[4] Curso de Direito Administrativo. 17ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 497.

[5] Sobre o tema, vide nosso Contratação por inexigibilidade de licitação com fornecedor ou prestador de serviço exclusivo. Breve análise do art. 25, I da Lei 8.666/93. RJML de Licitações e Contratos, n.26, p. 3 usque 12

[6]Quando a doutrina fala em impossibilidade de comparação objetiva entre as propostas, está se referindo, não ao preço, mas ao objeto material da proposta. O preço, entre os vários possíveis executores até pode (deve) ser colocado lado a lado para fins de comparação e estipulação de faixa de mercado, no intuito de justificar a contratação sob o aspecto da economicidade; mas, como o objeto é singular, não há um igual ao outro. Por isso não comporta comparação.

[7] Reconheço que parte da doutrina entende que a singularidade pode estar vinculada à notória especialização. Nesse sentido: MEIRELLES, Hely Lopes, Direito Administrativo Brasileiro. 19ª.ed. Malheiros. São Paulo, 1994, p. 258; MUKAI, Toshio, A natureza singular na contratação por notória especialização, RJML de Licitações e Contratos, n.26, p. 13/15

[8] JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses, Contratação Direta sem Licitação. 9ª ed. Fórum. Belo Horizonte, 2011, p.604.

[9] Vide: TCU, Súmula 252; JUSTEN FILHO, Marçal, Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 14ª. ed. Dialética. São Paulo, 2010, p. 367; MELLO, Celso Antônio bandeira de, Op. Cit., p.508; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo. 5ª. ed., Atlas. São Paulo, 1995, p. 273; CARVALHO FILHO, José dos Santos. 11ª ed. Lumen Juris. Rio de Janeiro, 2004, p. 226; JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses, Op. Cit. p. 605; MUKAI, Toshio, Op. Cit.

[10] CHIAVENATO, Idalberto, Gestão de Pessoas. 3ª. ed. Elsevier. Rio de Janeiro, 2008, p.402. TEIXEIRA, Gilberto Explica que a expressão capacitação tornou-se uma espécie de jargão, pois no atual paradigma de ensino e aprendizagem, “capacitar” o outro é questionável. (O processo-ensino aprendizagem e o papel do professor como gestor d  pensar. disponível em www.serprofessoruniversitario.pro.br/modulos).

[11] Disponível em www.kumon.com.br

[12] Op. Cit., p.371.

[13] Manual de Direito Administrativo. 11ª. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 36

[14] Op. Cit., p. 507.

Nos referimos a “empresa de organização de eventos” sem deixar de reconhecer que muitas delas são especializadas em eventos de ensino e capacitação, tais como seminários, congressos, work shops, cursos abertos a terceiros e in company. De qualquer forma, não são responsáveis por produção técnica ou científica, nem tampouco executam serviços de natureza singular.

[16] Sobre credenciamento, vide o excelente artigo de DALLARI, Adilson Abreu, Credenciamento. RDE n. 05/2006, Salvador, BA

[17] Op. Cit., p. 498.

[18] Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2o e 4o do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8º desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos.

[19] TCU, Acórdão 1.336/2006-Plenário, Rel. Min. Ubiratan Aguiar.

[20] FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. A contratação direta por notória especialização.Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 38, 1º jan. 2000. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/428. Acesso em:16 abr. 2013.

[21] Art. 24 – É dispensável a licitação:(...)VIII – para aquisição por pessoa jurídica de direito público interno, de bens produzidos ou serviços prestados por órgão ou entidade que integre a Administração Pública e que tenha sido criado para esse fim específico em data anterior à vigência desta Lei, desde que o preço contratado seja compatível com o mercado; (...) XIII – na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos.


* Luiz Cláudio de Azevedo Chaves é bacharel em Administração e Direito. Especialista em Direito Administrativo. Professor da Fundação Getúlio Vargas e da Escola Nacional de Serviços Urbanos-ENSUR e Professor Convidado da PUC-Rio. Autor da obra Curso Prático de Licitações-Os Segredos da Lei n8.666/93, IBAM/Lumen Juris, 2011. Ministra regularmente, em âmbito nacional o curso Como Contratar Serviços de TD&E na Administração Pública.

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